quinta-feira, 16 de setembro de 2010
Bernstein e Mahler
por Leandro Oliveira
Leonard Bernstein foi o primeiro a estabelecer ligações entre sua vida e carreira e aquelas de Gustav Mahler. Ambos eram judeus, maestros famosos em vida e compositores pouco reconhecidos ou respeitados a seu tempo... Evidentemente, a comparação é positiva somente para Bernstein. As obras de Mahler são verdadeiros monumentos expressivos do sentimento de um mundo particular. Mahler tem como pares Stefan Sweig ou Arthur Schnitzler entre outros e a tão falada decadência da Viena de sua época aparentemente se tornará realidade política na ocasião da Anexação em 12 de março de 1938 - o Finis Austriae que Freud anunciará em seus diários.
Enquanto a arte de Mahler realiza uma espécie de profecia velada, as composições de Bernstein são fruto do fascínio auto-referente de uma América pulsante, cheia de orgulho de seus valores e que acaba resvalando em alguns grandes centros como Nova Iorque - onde Bernstein construi boa parte de sua carreira - em um certo (e como não?) provincianismo.
Não há paradoxo nisto: parte do espírito "cosmopolita" nova-iorquino se desdobra em um senso genuíno e sincero de serem, a cidade e seus habitantes, o "umbigo do mundo". Interessantemente, as obras de Bernstein são saborosas, divertidas, por vezes grandiosas e cheias de pretensões bem intencionadas - mas muito pouca profundidade. Isso não é necessariamente um juízo de valor, mas uma característica inegável: enquanto cada compasso da obra de Mahler se veste de uma trama rica de significados, alguns deles perdidos em referências de um mundo cultural que penosamente teremos acesso, a obra de Bernstein fala daquela profusão de informações recorrentes ao universo mental de seus pares - alusões a Stravinsky, jazz, a música judaica ou o que quer que o valha, tornam-se curiosamente apenas gestos de virtuosismo estilístico, jamais profundidade espiritual. As questões da arte no primeiro são metafísicas; no segundo são emocionais.
Mas Bernstein é um grande artista e jamais gostaria que minhas palavras fossem entendidas como demérito. O fato, no entanto, é que sua grande colaboração para a história da arte ocidental é feita como intérprete. Sua leitura da obra de Mahler, por exemplo, é uma referência que acredito jamais será negada; e isso vocês podem ver na interpretação da Sinfonia nº7 que o compositor realiza com a Filarmônica de Viena.
A "sétima sinfonia" de Mahler e "Opening Prayer" de Lenny Bernstein serão apresentados esta semana na Sala São Paulo. A peça de Bernstein é inédita no Brasil e foi criada para ocasião da reinauguração do Carnegie Hall na década de 80.
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Um comentário:
Faz sentido. Bernstein, por mais interesse que possa ter como compositor, não tem como ser comparado musicalmente ao marido da Alma (do qual de fato é um ótimo intérprete). No capítulo Zeitgeist, mais interessante é contrastar Mahler e Strauss. Levei um tempo grande para aprender a gostar, e muito, do genial parceiro de Hofmannsthal e Zweig - mas no contraste ressalta sempre que em Mahler as orquestras e recursos monumentais nem de longe existem pour épater la bourgeiosie
e estão, sim, a serviço de um discurso metafísicamente moderno ou vice-versa. Algo que Strauss a seu jeito alcança nas últimas canções, ou talvez também - pensando música, tempo e relações sociais - naquela incrível "Capriccio" estreada em plenos anos 40 do século XX. Eine Oper ist ein absurdes Ding: http://www.youtube.com/watch?v=SB22mA8T2kU
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