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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

QUEM AQUI NÃO TEVE UMA NAMORADINHA QUE TEVE QUE ABORTAR?

Sérgio Cabral, candidato reeleito Governador do Rio de Janeiro é, antes de tudo - e a despeito de sua competência ou incompetência, não entraremos no mérito - é antes de tudo, dizíamos, um falastrão. Sua última máxima é uma mínima. Talyta Carvalho discute o caso.

por Talyta Carvalho

Sou jovem, mulher, namorada, filha e tento ser “filósofa-intelectual-acadêmica”. Sou uma daquelas garotas que as pessoas olham com a impressão (pouco importa se certa ou errada) de que à minha frente há um mundo de possibilidades, de coisas a serem vividas, de vitórias a serem conquistadas. Obviamente, não atingi nenhum ápice na vida ainda, seja ele o ápice pessoal ou profissional. A rigor, ainda não cheguei a lugar algum; muito embora pareça que a tendência é que um dia eu chegue, afinal, recebi os instrumentos para tanto. Imagine você leitor, o que uma gravidez acidental poderia representar neste exato momento da minha vida, que ao que tudo indica, caminha para um belo futuro?

Falo hipoteticamente, é claro. Sei que o leitor sabe que não estou, de fato, grávida. Apenas quis apontar o lugar de onde falarei sobre o polêmico tópico da legalização do aborto. Quis apenas que ficasse claro que, como se diz na Academia, tenho “capital simbólico” para discutir o assunto. Não pretendo fazer propaganda, não pretendo convencer ninguém da minha opinião, não pretendo fazer circo algum pegar fogo. Nunca quis escrever sobre este assunto, recuso propostas de falar sobre o tema, e nunca debato minha opinião fora do pequeno círculo de amigos próximos que tenho. Mas hoje eu vou falar sim neste assunto. Escrevo este post porque tem coisas quem ficam “entaladas” na garganta ao longo dos anos, e um dia a gente cansa de se omitir e dar espaço para que toda sorte de pessoas fale sem discernimento algum de coisa séria. Sim, aborto é coisa muito séria. Tão séria que é lamentável que a discussão gire em torno de argumentos que partem de certa “positividade e objetividade da lei”, o que quer que queiram dizer com isso. Já aviso: sou contra. Se você é a favor e se irrita com pessoas que, como eu, se recusam a passar a mão em sua cabeça como quem diz que “tudo bem fazer isso”, acha “evoluído” um país que aprova a legalização, e ainda que “a mulher tem direito de escolha sobre seu corpo”, uma dica: não continue lendo este texto. Você apenas irá ficar bravo(a) e sentir desprezo por uma pessoa como eu que não “entende” e não “respeita” o tal direito de escolha (“aliás, como pode uma menina esclarecida, estudada, pensar assim??”).

Antes de qualquer coisa: simpatizo com o sofrimento de mulheres que se encontram diante da agonia de uma gravidez indesejada; Eu mesma já passei pelo drama de suspeitar estar grávida de um namorado e me pegar angustiando o que eu poderia fazer para “resolver” a situação caso ela se confirmasse. Claro que a possibilidade de um aborto sempre passa pela cabeça de qualquer uma quando se vive o impasse na pele; perturbam sua cabeça questões como “meu namorado não quer esse filho, é justo o bebê não ter pai?”, “minha família vai me matar se eu disser que estou grávida”; “até quero ter filhos, mas o momento é péssimo, mal comecei minha vida, e um bebê agora vai mudar tudo”. A realidade é que nunca estive grávida, mas essas perguntas povoaram minha cabeça antes do teste resultar negativo. Eis aqui uma verdade inconveniente: decidir manter ou não uma gravidez é sempre uma decisão tomada em meio ao desespero. Uma mulher que diga ser capaz de decidir sobre isto baseada na reflexão e nas “conversas” com especialistas (médicos, assistentes sociais, psicólogos) e na ponderação do que é o “melhor” pra si, mente. É uma decisão terrível de ser tomada, e em uma instância, determinada principalmente por um afeto: medo.

Acho hipócrita gente que diz que é “hipócrita a discussão de aborto no país, que o Estado deve dar suporte a mulher pobre que faz aborto em clínica clandestina, blábláblá”. Mais ainda se quem fala é um homem. Homem que defende aborto alegando que o faz porque acha que a “mulher tem ser ouvida” e deve “ter direito sobre seu corpo” sempre soa a mim como um canalha. Ao menos tenha a coragem de admitir que você é a favor do aborto porque quer respaldo legal para não assumir a “bomba” que é a gravidez indesejada de sua namorada, amante, ficante ou caso de uma noite, e assim induzi-la a tirar o seu do reta sem pegar muito mal para você.

Aborto não é medida que se tome para não ter filhos em momentos indesejados. Todo mundo que transa sabe que pode ter uma surpresa rosinha e chorona depois de nove meses. Não é crime algum adiar, mesmo que para sempre, a maternidade: para isso é que existem os mais variados métodos contraceptivos. E se ainda assim vier um baby não desejado que poderá colocar todos seus sonhos abaixo ou ainda o qual você não terá condições de criar e sustentar, sempre há a opção de dá-lo para adoção: você não é obrigada por lei alguma a ser mãe de um bebê só porque você o gerou. O aborto não foi criminalizado, assim como o homicídio não foi criminalizado, por isso não aceito argumentos como o baseado na idéia de que a escolha deve ser permitida, algo como dizer “legalizando você assegura liberdade de escolha a todas as mulheres, se não concorda com a prática você tem o direito de não fazer. Quem quer faz, quem não quer não faz”. Isso me soa tão absurdo quanto dizer que se deve assegurar o direito dos cidadãos escolherem, por exemplo, em uma situação dramática qualquer, se cometem um homicídio ou não, sem que tenham de pagar em termos punição legal por isso. Sou a favor da vida, e a julgo inegociável.

Aborto não é mera questão de saúde pública. Converse francamente com uma mulher que tenha passado pela experiência (e antes que perguntem: sim, já conversei com muitas sobre isso, ricas e pobres). Em primeiro lugar, ela terá dificuldade de explicar como decidiu pelo aborto e, muitas vezes, fará referências a falas e conselhos de terceiros (em geral do pai, do namorado, amante, professora, analista) os quais ela desconfia que não deveria ter ouvido em um momento de tanta fragilidade e angústia. Em segundo lugar, por mais insensível que você seja, você vai notar com nitidez que o relato dela sobre a experiência exala uma percepção de que o que aconteceu naquele momento, naquela sala de uma clínica qualquer (clandestina ou super-higiênica e cara) foi uma violência com ela, e que antes fosse apenas uma violência física. Não conheço mulher alguma que tenha abortado e superado a experiência. Que ninguém se iluda pensando que é um ato que encerra ao final de um procedimento médico.

(EM TEMPO: Os postos de saúde distribuem gratuitamente camisinhas. Seu namorado, amante, caso de uma noite na balada, não tinham e não gostam de usar? Sem problemas -pelo menos no quesito “gravidez”. Advinha? Também distribuem anticoncepcionais de graça!!! Sim, você leu bem: DE GRAÇA!!! Quem diria, né?

EM TEMPO 2: No fundo no fundo, eu também acredito que a mulher tem direito sobre seu corpo: dá se quiser, se não quiser não dá. E também ingere remédios contraceptivos porque escolheu assim fazer e por ser “dona” de seu corpo pode muito bem impedir com essa atitude que outro ser ali se instale (em seu útero, precisamente) contra sua vontade. Mas uma vez que tenha escolhido (uma vez que há escolha) o risco de ter ou não outro ser como “inquilino”, aí já não há “direito sobre o corpo” que valha. Lembremos que são dois corpos agora, e embora tenha um “hóspede” indesejado em seu corpo, ela não tem direito sobre ele. Antes de tudo, ela “deixou” ele ali se instalar, sabia que poderia acontecer. Ele (o feto) é que tem direito sobre si. Então, que ele decida um dia após nascer se o melhor para ele é dar fim a sua vida ou não.)

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