por Leandro Oliveira
Com exceção dos sádicos, ninguém gosta de mandar gente embora do emprego. Muito menos, deveria gostar de mandar fora musicistas - gente normalmente sensível e dedicada, a despeito de sua destreza. Dito isso, a máxima: nem todo maestro é sádico. É com isso em mente que acompanho a querela entre os músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira, no Estadão de hoje, já antevisto nos jornais locais há algumas semanas.
Roberto Minczuk está, a duras penas, nos últimos cinco anos, tentando realizar no Rio de Janeiro aquilo que foi feito em São Paulo mais de dez anos atrás. Ali, infelizmente, as condições parecem um pouco problemáticas, mercê de fatores políticos e logísticos infinitamente mais complexos que aqueles da terra da garoa. Nada de novo no front. Embora possa parecer que no Brasil tais coisas sejam mais comuns que em outra parte, no mundo inteiro a relação entre músicos e maestro é conturbada.
Exemplo recente na Welsh National Opera: um oboista, que trabalhava na instituição há 34 anos, acusou o regente de bullying. O problema foi parar no tribunal.
Uma orquestra é um organismo sensível de alto rendimento. Os concertos geralmente são agendados com bastante antecipação, mudanças de última hora não são mais toleradas pelo público ou pelos patrocinadores mais antenados, e os ensaios nem sempre são programados em número adequado. Tudo isso, sem dúvida, gera algum senão muito stress. E embora o problema de uma orquestra esteja para além dos critérios de eficiência e racionalidade de uma gestão administrativa, a boa economia de meios é fundamental: um maestro, visitante ou titular do posto, precisa ser hábil e severo para obter o máximo de resultado no mínimo tempo disponível. Habilidade que nem sempre está presente.
Por isso, há que se considerar algo de notadamente "político" nesta relação maestro-orquestrais. Antipatias podem fazer com que a colaboração seja prejudicada e, não tenha dúvidas, se o músico não coopera, não há regente genial ou chiliquento que dê jeito. (Mesmo sendo o chilique violento como no vídeo abaixo; aos com coração frágil, ou amantes de Brahms, é altamente recomendável pular o áudio e seguir o texto.)
O que deve acontecer em tais casos? Idealmente, a parte que se sente incomodada deve reportar o incidente de um eventual recalcitrante ao administrador artístico, que precisa ser rápido e discreto ao lidar com o assunto. É sabido de ao menos um caso cujo dilema parece quase irreal onde o regente titular e o spalla - o líder dos primeiros violinos e o mais importante músico da orquestra, entre outras coisas, responsável pela afinação - não se davam. É algo como o técnico e o capitão do time serem inimigos. O administrador artístico, experiente no assunto, fez com que nos tantos anos de colaboração do maestro com a orquestra, os dois não tivessem que compartilhar o palco - um sistema de rodízio engenhoso que foi fundamental para a manutenção da boa governança do grupo.
Mas nada disso existe no Brasil, a não ser na Osesp.
Uma orquestra pode acomodar personalidades vaidosas e humildes. É de sua natureza. Mas não pode tolerar incompetentes e revolucionários. Ambos são motivos de conflito e, uma vez o conflito instaurado, o processo passa a ser doloroso e muitas vezes irreversível. No caso da OSB, infelizmente, o processo parece já ter dado água...
(para quem não lembra, a solução encontrada na Osesp para um problema similar de avaliação dos músicos, e a eventual demissão dos inadequados, foi não só a contratação dos aprovados na atual Osesp, mas a relocação dos desaprovados em uma nova orquestra, SOB AS MESMAS CONDIÇÕES DE TRABALHO antigas)
...e, dali em diante, temo, pouco poderá ser feito. Mesmo que a audição aconteça e o maestro selecione os seus, se bem organizados os músicos poderão sempre fazer pequenos boicotes, que facilmente minarão a qualidade artística do projeto como um todo. Com tantos regentes girando no posto, não é difícil saber que é disso que se trata o embróglio do Theatro Municipal de São Paulo; ali, a opção já foi tomada.
A vitória dos que gritam mais alto - maestros ou sindicatos - e não do bom senso mediado, sempre resulta na miséria institucional.
Com exceção dos sádicos, ninguém gosta de mandar gente embora do emprego. Muito menos, deveria gostar de mandar fora musicistas - gente normalmente sensível e dedicada, a despeito de sua destreza. Dito isso, a máxima: nem todo maestro é sádico. É com isso em mente que acompanho a querela entre os músicos da Orquestra Sinfônica Brasileira, no Estadão de hoje, já antevisto nos jornais locais há algumas semanas.
Roberto Minczuk está, a duras penas, nos últimos cinco anos, tentando realizar no Rio de Janeiro aquilo que foi feito em São Paulo mais de dez anos atrás. Ali, infelizmente, as condições parecem um pouco problemáticas, mercê de fatores políticos e logísticos infinitamente mais complexos que aqueles da terra da garoa. Nada de novo no front. Embora possa parecer que no Brasil tais coisas sejam mais comuns que em outra parte, no mundo inteiro a relação entre músicos e maestro é conturbada.
Exemplo recente na Welsh National Opera: um oboista, que trabalhava na instituição há 34 anos, acusou o regente de bullying. O problema foi parar no tribunal.
Uma orquestra é um organismo sensível de alto rendimento. Os concertos geralmente são agendados com bastante antecipação, mudanças de última hora não são mais toleradas pelo público ou pelos patrocinadores mais antenados, e os ensaios nem sempre são programados em número adequado. Tudo isso, sem dúvida, gera algum senão muito stress. E embora o problema de uma orquestra esteja para além dos critérios de eficiência e racionalidade de uma gestão administrativa, a boa economia de meios é fundamental: um maestro, visitante ou titular do posto, precisa ser hábil e severo para obter o máximo de resultado no mínimo tempo disponível. Habilidade que nem sempre está presente.
Por isso, há que se considerar algo de notadamente "político" nesta relação maestro-orquestrais. Antipatias podem fazer com que a colaboração seja prejudicada e, não tenha dúvidas, se o músico não coopera, não há regente genial ou chiliquento que dê jeito. (Mesmo sendo o chilique violento como no vídeo abaixo; aos com coração frágil, ou amantes de Brahms, é altamente recomendável pular o áudio e seguir o texto.)
O que deve acontecer em tais casos? Idealmente, a parte que se sente incomodada deve reportar o incidente de um eventual recalcitrante ao administrador artístico, que precisa ser rápido e discreto ao lidar com o assunto. É sabido de ao menos um caso cujo dilema parece quase irreal onde o regente titular e o spalla - o líder dos primeiros violinos e o mais importante músico da orquestra, entre outras coisas, responsável pela afinação - não se davam. É algo como o técnico e o capitão do time serem inimigos. O administrador artístico, experiente no assunto, fez com que nos tantos anos de colaboração do maestro com a orquestra, os dois não tivessem que compartilhar o palco - um sistema de rodízio engenhoso que foi fundamental para a manutenção da boa governança do grupo.
Mas nada disso existe no Brasil, a não ser na Osesp.
Uma orquestra pode acomodar personalidades vaidosas e humildes. É de sua natureza. Mas não pode tolerar incompetentes e revolucionários. Ambos são motivos de conflito e, uma vez o conflito instaurado, o processo passa a ser doloroso e muitas vezes irreversível. No caso da OSB, infelizmente, o processo parece já ter dado água...
(para quem não lembra, a solução encontrada na Osesp para um problema similar de avaliação dos músicos, e a eventual demissão dos inadequados, foi não só a contratação dos aprovados na atual Osesp, mas a relocação dos desaprovados em uma nova orquestra, SOB AS MESMAS CONDIÇÕES DE TRABALHO antigas)
...e, dali em diante, temo, pouco poderá ser feito. Mesmo que a audição aconteça e o maestro selecione os seus, se bem organizados os músicos poderão sempre fazer pequenos boicotes, que facilmente minarão a qualidade artística do projeto como um todo. Com tantos regentes girando no posto, não é difícil saber que é disso que se trata o embróglio do Theatro Municipal de São Paulo; ali, a opção já foi tomada.
A vitória dos que gritam mais alto - maestros ou sindicatos - e não do bom senso mediado, sempre resulta na miséria institucional.
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