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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Diário de Bordo 1 - Berlim


Berlim, Amsterdã e Bruxelas: estas serão as cidades que bisbilhotaremos no diário de viagens de Érico Nogueira, poeta e tradutor que a partir de hoje é mais um dos seletos aristocratas que compõem este projeto Ocidentalismo.org. A primeira parada de Érico foi também para alimentar a si - e a nós - da mais bela poesia contemporânea.

Por Érico Nogueira

Terça-feira passada, 24/08, partimos, Adriana e eu, para Berlim, onde fomos muitíssimo bem recebidos por Ricardo Domeneck, que inclusive nos cedeu o seu apartamento, dizendo "Eu me arranjo em outro lugar: vocês ficam aqui"; isso é que é hospitalidade.

Afora a cerveja e a comida alemãs - de que sou suspeito para falar -, foi a cidade mesma de Berlim que nos chamou a atenção. Uma cidade ainda hoje de cicatrizes abertas, quase no segundo decênio do séc. XXI; uma cosmópole onde a cena poética não sofre de provincianismo agudo; um lugar estimulante para a vida, para o pensamento, - e para a poesia, claro.

Com a biblioteca de Ricardo à minha disposição, pude ler o incrível poeta português Al Berto (1948-1997), e me deliciar com a sua linguagem a um só tempo bruta e doce - uma lição a quanto inconformismo ingênuo, a quanto confortável tradicionalismo possa haver em poesia; a tradução de Mandelstam assinada por ninguém menos que Paul Celan - simplesmente um clássico; e a poesia completa (em inglês) do poeta polaco Zbigniew Herbert (1924-1998), cujo poema "Why the classics" condensa em poucas linhas tudo o que eu queria (e ainda quero) dizer com a minha poesia:

Why the Classics

1

in the fourth book of the Peloponnesian War
Thucydides tells among other things
the story of his unsuccessful expedition

among long speeches of chiefs
battles sieges plague
dense net of intrigues of diplomatic endeavours
the episode is like a pin
in a forest

the Greek colony Amphipolis
fell into the hands of Brasidas
because Thucydides was late with relief

for this he paid his native city
with lifelong exile

exiles of all times
know what price that is

2

generals of the most recent wars
if a similar affair happens to them
whine on their knees before posterity
praise their heroism and innocence

they accuse their subordinates
envious collegues
unfavourable winds

Thucydides says only
that he had seven ships
it was winter
and he sailed quickly

3

if art for its subject
will have a broken jar
a small broken soul
with a great self-pity

what will remain after us
will it be lovers' weeping
in a small dirty hotel
when wall-paper dawns

Traduzido por Peter Dale Scott e Czeslaw Milosz.


Saímos de Berlim domingo, 29/08, às 8h30, com destino a Amsterdã; Adriana levando muitas fotos e impressões e um pretzel na mochila, e eu com um exemplar de "Aroma", o último livro do poeta alemão Durs Grünbein (n. 1962), um dos maiores nomes da nova poesia alemã - se não mesmo o maior. Grünbein retoma e desenvolve o hexâmetro alemão, e, leitor de Horácio, Marcial, Ovídio - mas sobretudo de Juvenal -, opera nessa tensão entre o passado e o presente, ontem e hoje, atualizando os procedimentos formais da sátira latina. Eu amei descobrir esse poeta: sensação de não estar sozinho... Vocês aguardem: em breve vou traduzir aqui o fenomenal "Torso des Polyphem", poema alusivo, claro está, não só à tradição greco-romana, mas também a Rilke.

E chegamos a Amsterdã...

Retirado de Ars Poetica.

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