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sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Book Curses


Quem nunca emprestou um livro e o perdeu de vista, não leia este post. Para todos os demais, Fernanda mostra que o problema não é típico da vida contemporânea. Emprestar às calendas estes nossos tão desejados objetos de desejo, ou mesmo tê-los literalmente roubados, são coisas de sempre - tanto assim que é possível inventariar algumas soluções já bastante engenhososas desde a Idade Média.

Por Fernanda Vaz

Não sou eu a maior fornecedora de livros - as bibliotecas dos amigos costumam ser muito maiores e mais interessantes do que a talvez meia centena da qual sou dona até agora. Aos emprestadores que sofrem com amigos caloteiros, entretanto, tenho uma dica oriunda da idade média: maldições escritas.

Numa época em que um único exemplar de uma obra era fruto do trabalho árduo de um monge copista, um livro que não fosse copiado não sobreviveria, bem como um que fosse adulterado ou tivesse suas boas cópias destruídas antes que outros pudessem reproduzí-las. O roubo de um livro criaria uma lacuna talvez irremediável na biblioteca de origem. Assim, para proteger de ladrões o fruto de seu trabalho, alguns monges depois de terminar a cópia deixavam escritas maldições como esta:

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, Amém. No milésimo, duocentésimo, vigésimo nono ano da encarnação de nosso Senhor, Pedro, de todos os monges o menos importante, deu este livro ao [Monastério Beneditino do] mais abençoado mártir, São Quintino. Se alguém roubá-lo, que saiba que no Dia do Juízo o mais santo mártir será contra ele o acusador, diante da face de Nosso Senhor Jesus Cristo.

ou:

Thys boke is one
And Godes kors ys anoder;
They take the ton,
God gefe them the toder

Que em uma tentativa minha de tradução, ficaria:

Coisa uma é este livro,
Outra é a maldição Divina.
De quem roubar o primeiro,
A segunda é a sina.

Ou ainda esta, que foi encontrada em um Breviário numa biblioteca em Cambridge, e foi escrita como se fosse o livro a falar (de novo com minha tradução meio manca no final):

Wher so ever y be come over all
I belonge to the Chapell of gunvylle hall;
He shal be cursed by the grate sentens
That felonsly faryth and berith me thens.
And whether he bere me in pooke or sekke,
For me he shall be hanged by the nekke,
(I am so well beknown of dyverse men)
But I be restored theder agen

Onde quer que acabe, no final,
Pertenço à Capela de Gonville Hall;
Por grande sentença é amaldiçoado
O que me leva de mau grado:
Quer em bolsa ou saco me leve,
Por minha causa ser enforcado deve
(por muitos sou bem conhecido [para ser notado])
a não ser que seja eu devolvido.

Mas a mais legal, na minha opinião e também na do autor desse post, que foi de onde tirei tudo isso (não quero ser amaldiçoada eu, por não dar os créditos), é essa aqui, em forma de código:


Uma adaptação em português, muito mais óbvia e menos enigmática:




Começando a ler da linha do meio pra cima, em zigue-zague, a mensagem é uma bênção ao escritor do livro. Da linha do meio pra baixo, uma maldição ao possível ladrão. How incredibly cool is that?

Pois bem: antes de emprestar sua linda edição Cosac & Naify de... qualquer coisa que a Cosac & Naify tenha publicado (como boa cliente de sebo e compradora de Penguins, não tenho idéia), vale a pena rabiscar nela algumas linhas de pragas. Condenar a alma do amigo caloteiro ao inferno pode parecer um tanto drástico, mas sempre se pode desejar um ataque de coceira ou uma unha encravada, não?

Retirado de Apfelsaft

2 comentários:

w disse...

Excelente! Vou começar a fazer isso, pois os emails com a pergunta "eu emprestei meu Guerra e Paz para algum de vocês?" não têm funcionado.

Anônimo disse...

I am doing research for my university paper, thanks for your excellent points, now I am acting on a sudden impulse.

- Kris

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